Curta no Facebook

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

cotidianas #126 - Primeiro do Ano


Sentaram na areia depois dos abraços, dos brindes, dos votos de ano novo, ainda um pouco disfarçadamente emocionados.
- O que tu pediu?
- Ãhn? - respondeu voltando de onde seus pensamentos andavam vagando.
- De Ano Novo. - insistiu ele explicando a pergunta - Ali, pros pulinhos nas ondas?
Eram amigos de longa data. Amigos o bastante para que ele se desse o direito naturalmente de bisbilhotar sobre os pensamentos dela. Poder-se-ia dizer que ele era o melhor amigo que tinha. Com as outras garotas sempre tinha o ingrediente da competição, da inveja, da falsidade mas com ele sentia-se totalmente segura para falar o que bem entendesse. Por conta dessa cumplicidade é que dias antes manifestara-lhe a intenção de um ano novo diferente. Cansara de se submeter às grosserias do namorado autoritário, ciumento, machista e egoísta e uma semana antes do reveillón, noticiava ao amigo o rompimento.
Por isso estavam ali, juntos, agora pouco depois da meia noite naquela praia diante do mar. Ela e o amigo. O melhor amigo. Para quem não tinha frescuras ou segredos. Só que agora, de repente sentia-se um pouco embaraçada em responder à pergunta.
- Eu? - fazendo-se de desentendida.
- É, tu mesma! Tá vendo mais alguém aqui - brincou fingindo irritação.
- Eu tô vendo um montão de gente aqui! - e gargalharam juntos.
Cessado o riso, ela continuou, agora demonstrando uma certa ansiedade:
- Ah, um dos pedidos foi aquela coisa toda de paz e biriri-bororó, né; o outro foi aquela coisa de saúde e patati-patatá - e riram juntos - E ou último foi... Eu pedi pra voltar com o Marcos. Eu sei que ele não vale nada mas eu sou louca por aquele cara.
Assim que acabou a última frase uma lágrima silenciosa escorreu pelo rosto em meio ao barulho do foguetório na beira do mar, mas à que ela logo apressou-se em enxugar com os punhos. E esforçando-se para retomar um tom alegre, respirou fundo e recompôs-se:
- Mas não quero estragar a tua noite de Ano Novo, - disse ainda fungando - Mas e tu? O que tu pediu de Ano Novo?
- Mas eu nem pulei ondinha, nem nada. - esquivou-se.
- Ah, mas a gente sempre pede alguma coisa. - insistiu ela agora já sorrindo verdadeiramente.
Agora foi a vez dele ficar sem jeito. E ela só não percebeu o rubor de sua face por causa da intensidade do reflexo dos fogos avermelhados. Mas respondeu timidamente sem tirar os olhos fixos da areia:
- Ah, um dos pedidos foi aquela coisa toda de paz e biriri-bororó - e riu-se da imitação da manifestação da amiga - o outro foi aquela coisa toda de paz - ao que ela completou junto - 'patati-patatá' -caindo ambos na risada.
- E o outro? - quis saber a garota.
- Não teve outro.
- Ah, fala.
- Não teve mesmo. Foram só dois... eu acho - disse, finalmente tirando os olhos do chão e mirando fixamente os olhos da amiga. Foi um breve momento de silêncio entre os dois, em que ficaram se encarando até que ele finalmente desviou o olhar e o direcionou para o céu:
- Olha lá que tri aqueles fogos! - chamou atenção apontando.
- Onde? - empertigou-se, curiosa.
E voltando a cabeça na direção dos fogos, suas cores explosões e formas diferentes, não pode ver os olhos do amigo, marejados, vazios, apenas com o reflexo dos fogos que explodiam desenhando um coração.



Cly Reis

Nenhum comentário:

Postar um comentário